14 janeiro, 2006

 

A dor da noite


E aí vem a nostalgia. A dor da noite, que a gente também sente de dia. Paradoxalmente, uma dor gostosa de sentir.

Em um destes fins de semana eu estava passeando por um parque e vi umas crianças jogando futebol, em uma tarde ensolarada. Pareceu tão familiar! Quase conseguia sentir o cheiro das tardes de sol no Brasil, perdidas no tempo...

É por isso que o nosso lugar faz parte da construção nossa identidade. Imagens perdidas ficam lá no fundo da memória, de roupa secando no varal, da vó torrando café no fogão de lenha, do vô colocando seu chapéu para ir ao forró. E sensações também ficam vivas: o cheiro delicioso da fábrica de doce de leite no centro da cidade, o cheiro do sabonete na pele depois do banho (depois de um dia de brincadeiras). Dobrar completamente o pescoço para olhar para os tios “lá em cima”, separar jujubas pela cor e comê-las com um prazer sem igual. Conseguir juntar as letrinhas das placas das ruas e formar uma palavra. Ouvir estorinhas! Tomar leite com café no “café da tarde”! Não querer dormir (quem diria)! Aprender a fazer gelatina como se estivesse seguindo a receita de um chéf francês! Entrar na piscina sem medo da água fria, tomar banho até os dedos ficarem enrugados. Reclamar porque os adultos tiram as facas de perto e ninguém mais aqui é criança para ser proibido de usar facas...

Por que é que a gente cresce, em?

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12 janeiro, 2006

 

Preteana



Essas histórias e estórias sobre as línguas são boas demais! Outro dia estava conversando com um chinês, e aí, como sempre, a conversa caiu no “o que você faz?”. Acho essa pergunta um horror, porque é difícil explicar até para mim mesma o que eu faço. É algo complicado e confuso, como a maioria das propostas de doutorado. Tentei explicar como pude, e ele, com um super entusiasmo: “nossa, que legal, que coisa interessante! Queria estar fazendo isso!”. Eu, sem entusiasmo algum, quase disse para ele ficar no meu lugar...
Quando devolvi a pergunta, ele disse que faz o doutorado na lingüística e estuda o modo como as populações criam uma identidade própria através da linguagem. E aí foi minha vez de repetir todas as exclamações dele! Com toda a sinceridade! Não deve ser uma coisa legal demais de estudar?

A história que uma amiga portuguesa me contou é um exemplo de como as línguas dão voltas, se inserem na vida das pessoas e por vezes criam situações engraçadas. Ela disse que em Portugal, muitas mulheres têm o nome de “Preteana”. Nas pequenas vilas, “prete” é uma palavra usada com o sentido de “ponha”, “coloque”. Os filhos nasciam nas vilas e os pais iam até as cidades maiores, chegavam no cartório e diziam “prete Ana” (ponha (o nome de) Ana). O funcionário do cartório, homem de cidade grande que não sabia o que era “prete”, escrevia tudo do jeito que ouvia.

E aí minha amiga portuguesa foi explicar a história, em inglês, para um italiano. Em inglês, “ponha Ana” seria “put Ana”. E, aos ouvidos do italiano, surge uma palavra conhecida: “putana”!


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10 janeiro, 2006

 

Sauna


Ontem fui à sauna. Quentinho! Queria morar lá dentro! O engraçado é o recadinho na porta, dizendo para as pessoas não ficarem mais de 15 minutos porque o ambiente quente pode ficar "desconfortável". Desconfortável é lá fora!

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09 janeiro, 2006

 

Florzinha do Lácio




Com o tempo e as mudanças que ele traz, perdi muito do meu sotaque mineiro. Perdi meu “uai” (se é que um dia tive), perdi meu “demais da conta”. “Perdi meu trem”.
Mas, corrigindo meus textos, descobri que os diminutivos me sobram. Vou comer uma coisinha, vou tomar um cafezinho, vou dar uma lidinha neste textinho. Talvez seja uma tentativa de tornar a conversa mais aconchegante e carinhosa. Ou talvez seja uma tentativa inconsciente de deixar as outras coisas proporcionais ao meu tamanho.

O interessante é que não posso emprestar meu sotaquinho à língua inglesa. A gente só usa “small” ou “little” quando a coisa é verdadeiramente pequena. Ô língua pobre!
Mais uma vez lembro do Z, em uma das nossas brigas,dizendo: “a língua portuguesa é uma língua rica. Explique melhor o que você quer! Abuse dos verbos, substantivos, adjetivos e preposições. Vamos lá!”

Ele tinha razão (cheio de razão, esse Z, menos nas brigas): a língua portuguesa é mesmo rica. A gente tem que falar inglês para descobrir o quanto é bom falar português. Não que falar inglês seja ruim, mas é uma língua objetiva e comercial. Prova disto é que os adjetivos vêm antes dos nomes. A propaganda é a alma do negócio!
E estava aqui pensando, talvez fosse mais fácil brigar em inglês. Exatamente pela objetividade. Pela praticidade. Mas na hora de fazer as pazes... aí não tem pra ninguém! O amor precisa da poesia e do aconchego da nossa língua mãe.

E eu não poderia terminar este texto senão com muitos beijinhos!

P.S. Na foto, a florzinha virou folhinha do Lácio. Congelada, é claro!

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